segunda-feira, 12 de março de 2012

Como estão as condições de trabalho nos supermercados

“As três maiores redes do país informam que cumprem a legislação trabalhista e vão além. Mas enfrentam o desafio de combater o assédio moral.”



As três grandes redes supermercadistas que atuam no Brasil – Pão de Açúcar, Carrefour e Walmart – são protagonistas do movimento da responsabilidade social empresarial no país, com uma série de boas práticas. Como exemplo, destacamos o monitoramento da cadeia da carne para prevenir e evitar a compra de produto que se origine de fazendas ilegais, que desmatam e utilizam trabalho análogo à escravidão.
Por meio do rastreamento dos fornecedores, via CNPJ das notas fiscais, os grandes supermercados podem garantir a seus clientes a origem da carne que oferecem em suas gôndolas. Se conseguem combater o desmatamento e promover o trabalho decente na cadeia produtiva, como eles se comportam em relação aos seus próprios funcionários?
Para esclarecer essa questão, perguntamos aos três grandes supermercados como eles agem em relação aos seguintes temas: jornada de trabalho, horas extras, descanso semanal remunerado, licença-maternidade e relacionamento com sindicatos da categoria. As respostas foram as seguintes.
Jornada de trabalho/horas extras – Pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e acordos coletivos, a jornada de trabalho é de 44 horas semanais, incluindo sábados e domingos. Os funcionários podem agregar mais duas horas extras por dia. Os acordos preveem pagamento dessas horas, com 60% de acréscimo sobre a hora normal, ou compensação em dias de folga.
O funcionamento durante o final de semana também está fixado em acordo coletivo. De modo geral, a jornada e as horas extras são as mesmas, mas, em algumas regiões (São Paulo, por exemplo), as horas extras trabalhadas aos domingos não podem ser incluídas no banco de horas geral da empresa.
O Carrefour estabeleceu prazo de 90 dias para os funcionários “zerarem” as horas extras com folgas. Caso isso não ocorra, a empresa paga as horas extras. A cobertura de folgas e férias é feita por funcionários contratados para essa finalidade.
O Pão de Açúcar segue a convenção para as horas extras, que é compensação (quando for possível) ou pagamento com acréscimo de 60% sobre a hora normal trabalhada.
O Walmart também segue a CLT e a convenção no que diz respeito à jornada de trabalho e ao pagamento de horas extras. Recentemente, introduziu a jornada flexível de trabalho para todos os funcionários das 483 lojas espalhadas por 18 Estados brasileiros. Dentro de uma grade de horários para início e término do expediente, o profissional pode definir uma jornada de trabalho que deixe tempo livre para compromissos pessoais. O horário flexível no Walmart é a única experiência do gênero no varejo.
Descanso semanal – O descanso semanal remunerado está regulamentado pela Lei 605/1949, pelo Decreto 27.048/1949 e pela Lei 11.603/2007. Pela lei de 1949, estabeleceu-se que o descanso semanal deveria recair preferencialmente no domingo. O decreto, também de 1949, estabelece os casos nos quais é possível trabalhar aos domingos – motivo de força maior ou realização/conclusão de serviços inadiáveis.
Como a CLT exige autorização prévia para o trabalho dominical, a Lei 11.603/2007 regulamenta o trabalho aos domingos para o comércio. As três redes seguem a legislação.
Licença-maternidade – Até o momento, a licença-maternidade de 180 dias só é obrigatória no serviço público e opcional na iniciativa privada. O INSS paga quatro meses de salário, e os outros dois meses ficam por conta da empresa, que, no entanto, pode deduzir integralmente a despesa do imposto de renda devido.
O Walmart Brasil e o Grupo Pão de Açúcar estão entre as empresas privadas que estenderam o benefício a suas funcionárias por mais dois meses. O Walmart informa que já faz isso desde 2008. No Carrefour, a licença-maternidade é de quatro meses.
Relacionamento com sindicatos – As três redes informam também que mantêm um constante e bom relacionamento com os sindicatos de trabalhadores de várias categorias representativas dos funcionários. Outra informação importante é que essas redes buscam fazer valer o acordo coletivo mesmo nas lojas mais afastadas. Ou seja, não esperam que um sindicalista ou um fiscal do trabalho denuncie uma irregularidade. A própria administração monitora as lojas e corrige os possíveis desvios do acordo coletivo. Vale lembrar que, embora as cláusulas principais sejam iguais em todo o país, cada região pode apresentar alguma particularidade.
O que oferecem a mais
Planos de carreira - Há, nas três redes, planos de desenvolvimento de carreira e capacitação para ocupar novos postos. Os grupos dão ênfase a esse desenvolvimento porque os supermercados têm sido a porta de entrada para o mundo do trabalho de centenas de milhares de jovens, principalmente jovens pobres, pois a exigência para os cargos iniciais é o ensino fundamental completo. Como o ramo se torna cada vez mais especializado, é importante preparar e reter os talentos. Além do treinamento interno, há apoio para completar a escola e até a universidade.
Valorização da diversidade – As redes também vêm desenvolvendo políticas de diversidade, com foco na valorização de gênero, capacitando mulheres para ocupar cargos de liderança nas lojas e na estrutura administrativa das empresas. Isto se deve ao fato de 80% da clientela ser constituída por mulheres de todas as idades. De acordo com o Carrefour Brasil, 23% dos cargos de liderança da rede são ocupados por mulheres. O Walmart Brasil relatou que possui um Comitê de Mulheres, ligado diretamente à Presidência, como instância para desenvolver iniciativas que permitam acelerar a liderança feminina na empresa. O Pão de Açúcar não informou nenhuma ação específica para gênero. Busca, no entanto, contratar pessoas da terceira idade para trabalhar no atendimento das lojas.
Participação nos lucros – Pão de Açúcar, Carrefour e Walmart informam que concedem participação nos lucros e resultados (PLR) a seus funcionários.
Redução da informalidade – A informalidade, ainda uma característica predominante no setor de comércio e serviços, nessas grandes redes foi bastante reduzida, mesmo nos serviços terceirizados, o que garante a capilarização dos direitos trabalhistas para um número cada vez maior de trabalhadores.
Assédio moral, o desafio
O bom relacionamento com sindicatos, o cumprimento da legislação trabalhista e das convenções coletivas e as ações de valorização profissional adotadas pelas grandes redes têm se refletido na diminuição de processos na Justiça trabalhista ocasionados por desrespeito à CLT ou aos acordos coletivos.
No entanto, as redes supermercadistas estão enfrentando um problema crescente: os processos por assédio moral. E trata-se de um desafio e tanto, porque o problema tem mais a ver com comportamento de determinados funcionários (chefes, na maioria) difícil de ser monitorado em grupos com tantos empregados espalhados por uma vasta extensão geográfica. As três redes já foram condenadas a pagar indenizações que variam de R$ 20 mil a R$ 2 milhões.
O Pão de Açúcar é o maior empregador privado do país, com 160 mil funcionários. O Walmart informa que tem 90 mil empregados e o Carrefour, 80 mil.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) trata o assédio moral como problema de saúde pública, reconhecendo não haver um só setor profissional que esteja livre do problema. A OIT define assédio moral como violência moral no trabalho: o uso de xingamentos, palavras depreciativas, piadas e atitudes que humilhem o trabalhador, atingindo sua dignidade e autoestima. Não é um fenômeno novo no mundo do trabalho. Novidade é que ele passou a ser tratado como algo que não é “inerente” ao trabalho. Ou seja, ninguém deve ser humilhado em situação nenhuma, inclusive no escritório ou na fábrica.
Aqui no Brasil, a legislação sobre o tema ainda está sendo construída, à medida que as denúncias viram processos e processos viram decisões que criam jurisprudência.
Hoje, além dos comerciários (grupo em que se inserem os trabalhadores dos supermercados), bancários e petroquímicos são os que mais procuram a Justiça clamando por indenização em virtude de assédio moral. Isto demonstra que, mais do que dinheiro, o assédio faz com que as empresas percam reputação, algo difícil de recuperar.
Para acabar com esse problema, é preciso mudar o comportamento das pessoas. Como? Não há uma receita pronta, mas a gestão responsável sugere alguns caminhos:
•    O primeiro deles é estabelecer um código de conduta em que fique muito claro o que pode e o que não pode ser feito ao tratar os funcionários no ambiente de trabalho;
•    O passo seguinte é treinar todos os funcionários, mostrando na prática como aplicar os princípios do código de conduta. É importante repetir o treinamento periodicamente, para reforçar a mensagem e verificar como o código vem sendo assimilado por chefias e subordinados;
•    Por último, a liderança precisa dar o exemplo.

Nenhum comentário: